Não
confie na frase de sua avó, de sua mãe, de sua irmã de que um dia
encontrará um homem ou mulher que você merece. Não existe justiça no
amor. O amor não é censo, não é matemática, não é senso de medida, não é
socialismo. É o mais completo cia é que se aproxima e não
larga sua boca. Amor é engolir de volta os conselhos dados às amigas. É
viver em crise: desequilíbrio. Ama-se logo quem a gente
odiava, quem a gente provocava, quem a gente debochava. Exatamente o
nosso avesso, o nosso contrário, a nossa negação. O amor não é
democrático, não é optar e gostar, não é promoção, não é prêmio de bom
comportamento. O melhor para você é o pior. Aquele que você escolhe
infelizmente não tem química, não dura nem uma hora. O pior para você é o
melhor. Aquele de quem você procura distânou por não merecer a companhia ou por não se merecer.
Amor é ironia. Largará tudo — profissão, cidade, família — e não será
suficiente. Aceitará tudo — filhos problemáticos, horários
quebrados, ex histérica — e não será suficiente. Não se apaixonará pela
pessoa ideal, mas por aquela que não conseguirá se separar. A
convivência é apenas o fracasso da despedida. O beijo é apenas a
incompetência do aceno. Amar talvez seja surdez, um dos dois não foi
embora, só isso; ele não ouviu o fora e ficou parado, besta, ouvindo
seus olhos. Amor é contravenção. Buscará um terrorista somente para
você. Pedirá exclusividade, vida secreta, pacto de sangue, esconderijo
no quarto. Apagará o mundo dele, terá inveja de suas velhas amizades, de
suas novas amizades, cerceará o sujeito com perguntas, ameaçará o
sujeito com gentilezas, reclamará por mais espaço quando ele já loteou o
invisível. Ninguém que ama percebe que exige demais; afirmará que ainda
é pouco, afirmará que a cobrança é necessária. Deseja-se desculpa a
qualquer momento, perdão a qualquer ruído. Amar não tem igualdade, é
populismo, é assistencialismo, é querer ser beneficiado acima de todos, é
ser corrompido pela predileção, corroído pelo favoritismo. É não fazer
outra coisa senão esperar algum mimo, algum abraço, algum sentido. Amor
não tem saída: reclama-se da rotina ou quando ele está diferente. É
censura (Por que você falou aquilo?), é ditadura (Você não devia ter
feito aquilo!). É discutir a noite inteira para corrigir uma palavra
áspera, discutir metade da manhã até estacionar o silêncio. Amor é uma
injustiça, minha filha. Uma monstruosidade. Você mentirá várias vezes
que nunca amará ele de novo e sempre amará, absolutamente porque não tem
nenhum controle sobre o amor.
- Carpinejar
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